Caramba, única, única Catarina que conheci, fogo, fogo, que eu vou descer. Saindo de Buenos Aires até Rosario, mais uma estrada numa viagem de vinte e poucos dias. Filha solteira, velha antes, da idade que tenho agora, mas conheci com 12 anos. Catarina e a mãe, óculos de aros escuros, fora de moda, quando não era moda. A gente dormia, Catarina lendo um livro do Paulo Coelho, a luzinha do ônibus, modelo dos 80, em 92, a gente descansando, noite longa, viagem demorada, não vamos parar tão cedo, escuro lá fora, só um ponto de luz, no fundo, acordado aqui dentro. E o fogo, fogo, meu Deus, começa baixo, mas fica indiscreto, Catarina grita, tem fogo, fogo, para que eu vou descer, motorista, Deus meu, misericórdia. E os passageiros, confusos, as luzes acendem, o ônibus no acostamento. Vem da frente o extintor, shuuu, shuuu, fumaça, cheiro forte, coisa branca, muito branca, e o fogo acabou. A luzinha e o livro de Catarina, meu filho. Desculpe, pessoal. Fiquei nervosa.
Tuesday, April 28, 2009
Monday, April 27, 2009
Faz 20 minutos, desci na estação central de trem daqui de Frankfurt. Desci sem imaginar que, ao cruzar a avenida em frente, veria um bairro só de turcos e indianos. Comi um falafel apimentado. E, buscando o hotel, pedi licença para duas garotas que fazem programa em tcheco. Para não falar do tropeço em meia dúzia de jovens contando gramas de crack. Frankfurt, que tem uma praça cheia de coelhos, é assim. Na estação, paguei por menos de 15 minutos de armário para deixar a mala enquanto corria para o banheiro. Suei frio.
Monday, April 20, 2009
Manooela refaz completamente os modos quando se apaixona. No ensaio da Orquestra de Câmara da Cidade, no México, pegou na mão de Camila, contrabaixista, e perdeu o ar. No camarim, trocaram um pequeno bilhete, daqui a 30 minutos no Café Hoyitos, no 653. Suco de laranja, não. É ácido e estou clareando os dentes. Manooela viu graça e pediu uma água com gás. Conversaram sobre poesia. E. E. Cummings e Pessoa, o favorito de cada uma. Repetiram as passagens mais bonitas. Camila teve vontade de ler o Livro do Desassossego. Manooela não teve nenhum interesse especial por No thanks.(may i touch said he
- Te vejo de novo?
how much said she
a lot said he)
why not said she
- Anote meu telefone.
- Posso te dar um beijo.
- Estava para fazer a mesma pergunta.(let's go said he
not too far said she
what's too far said he
where you are said she)
Manooela quis o gosto da boca de Camila para sempre. Mas, ansiosa, fumou um cigarro.
Wednesday, April 15, 2009
Quando danço assim, corpo chacoalha, se vem de cá e vai pra lá, sobe ou desce, estica e encolhe, tem até música da Xuxa. Mas quando danço assim, no meio do quarto, da rua; se perco a noção dos minutos e das horas, se me lembro de muita coisa e invento outras tantas, revendo gente que conheci e pessoas que esqueci; quando o céu fica mais perto daqui debaixo, ou sou eu no alto de uma cordilheira nevada; o frio, o calor, tudo vira primavera, em abril; confundo Avenida Paulista com Grande Avenue e vejo um mamute no zoológico daqui, essa estação de metrô que arrisquei em Berlim; porque tem esse balanço, de quando o ônibus pega no tranco, minha tia pedalando no banco da frente, vou sentir que foi mais, bem, bem mais que simples 3 minutos e 42 segundos de uma bonita melodia em francês.
Monday, April 13, 2009
Durante os três meses que passou em Paris, Manoel conheceu François num show perto de St. Germain. Comprou o disco e declarou: sempre soube que me mataria; finalmente encontrei a última trilha sonora. Merci.
Baixista para banda franco-inglesa. François and the Atlas Mountains. Contato: myspace.com/francoisinbristol
Qual dos seus dois irmãos é mais velho?
O François só é meu amigo. Amigo de infância. E o Rafa é mais velho.
Isa, linda, dança comigo?
Trouxe essa música pra fechar a aula. O título é "Grande Avenue".
Lá pro final de Invasões Bárbaras, vem Françoise Hardy, estonteante Hardy, com essa canção, esqueço o nome, linda, linda, a música agora, meus amigos saem das nuvens, acho, é mais ou menos isso que ela diz. E só entendi porque tive três amigos assim.
Labels: Culpa do pôster na parede
Saturday, April 11, 2009
André não entendeu muito bem, quando ouviu, numa noite de 76, um som entrando pela janela, os speakers soando baixo, Nick Drake aqui dentro, noite lá fora, as luzes cruzando a lente dos óculos, faróis desajustados no rosto, a vontade de escrever sobre um senhor atravessando o Sena, esses filmes que dizem tanto sobre a gente falando de gente tão longe, agora ele escreve todas as noites, compulsivamente, quem atravessa o Sena, quem não tem rio algum, se é o jeito de falar, ouvir, a música muda, o texto diz coisa nova e velha, lembra algumas pessoas, grandes pessoas, esquece alguns lugares, grandes lugares, esquecidos, impregnados em cada palavra, dá saudade, saudade, mas se dissesse que foi na estrada de M'Boi Mirim, aquela rua apertada no centro de Praga, mas a sensação de, não tem, não tem, "a place to be", os anos vão contando os meses, precisa de música, muda a harmonia, um livro ao lado da cama, claro, pensa cada vez mais asterisco, episódios cheios de observações, não tem como evitar, André, André, o vento lá fora vai sempre soprar uma melodia que faz lembrar alguém, um dia ou alguma coisa.
Wednesday, April 08, 2009
Detesto soar piegas, parecer apaixonado, babão. Mas se acordei às 0h42 para escrever sobre ela é porque realmente dei sorte; estou tranquilo, ser fácil sonhar de novo.
Monday, April 06, 2009
Não se preocupe, Renata; é só uma fase, minha filha. Vai passar. Posso perguntar quem vai no jantar?