Wednesday, November 29, 2006

Hoje, acordei diferente. Sabia. Há pouco ganhei de presente um texto que poderia ter sido meu - talvez seja pretensão, mas é assim que eu sinto. Agradeço cada cruzamento.


Um ponto de luz, Fauzi Arap.

A presença do mundo que surdamente me invade... O som, a vibração de tudo, os gemidos de dor e de prazer e os cantos e os uivos e os gritos e anúncios de televisão, eles me atravessam e eu vibro como se fosse a corda de um instrumento. De quem? Eu estou condenado? Viver assim? Viver a vida de todos por não saber como viver a minha? Eu só aprendi a viver um palmo do chão, um pouco no ar. Quando eu toco as coisas, elas quebram e eu recuo... Será que haveria um modo de tocá-las com delicadeza, será que eu ainda poderia aprender? Ou será que é esse o problema que o destino me propõe resolver? Como viver sem tocar o chão e ao mesmo tempo... Não sei, eu mesmo não me entendo... Vocês quiseram minha cabeça. E eu deixei... Vocês arrancaram minha cabeça do corpo e agora não há como voltar atrás. Eu me viciei em viver dividido. Isso é uma doença? Mas ela é de vocês também, não só minha... O que eu tenho tentado o tempo todo, minha vida toda, é corresponder ao que vocês me comunicam, é o bem. (...) E eu me tornei escravo da vontade alheia, do desejo alheio... por não ousar tavez reconhecer a minha própria vontade, o meu próprio desejo. Eu sei muito mais de vocês do que de mim. Eu não sei ser eu.

Saturday, November 25, 2006


- Porque eu quero arte, e você, bem, você sempre foi, sendo cada vez mais; seu projeto é dinheiro. Está bem, ou bom, enfim; sem a prata, faço pouco. E de pensar, então, que, com tanto ouro, você não fez nada.

Decidiu: quando um mudo diz alguma coisa, o sol escurece, intranqüilo. Porque o paraíso dos covardes é sempre previsível. Assobiou uma música triste, a mais doída que lembrava, pensando no tom agudo do sopro de quem cantou alguma vez. Estava esfriando. Sempre está, corrigiu o pensamento, com medo de esquecê-lo novamente e, despreparado, cair no próximo capítulo. Com dúvida, refez a tese de que. Não sou mais gelo derretendo em água cálida; não sou. O sonho que desmantelou porque a vida tem regras, e o mundo condena a exceção. Não sou, porque o sentido vem na contramão. Nasci morno e esfriei, o tempo todo. Que pena, sentiu. Chorou a primeira vez, quando - imaginou - "sou gelo, de tão frio; a morte é meu ponto de fusão". Ai, que saudade - saudade do medo de, líquido, perder contorno, ser tudo o que todo mundo é, sem medo do confronto, senhor fajuto da solidão. Pouco importa: morro igual a todo mundo, embora sozinho no Império da Condensação. Cada vez mais teso, em dias duros, de muito pouco movimento. Um dia, quando sonhar longe daqui, vou pedir para ser oceano outra vez. Nas tardes em que foi de lá, pensando nos declínios daqui; quando uma flor mudou de nome, quando comeu a buceta mais rosada da sua vida. Não estava convencido: fosse gelo de novo, ou água parada, a vida insinuava todo tipo de frustração. Abandonou o tormento, enfrentou o pai pela segunda vez:

- Incomoda, eu sei. Quando falo, sem limite; fizeram susto de mim. Não é por ofensa, mas não deu certo; seu fardo é ter certeza disso, até mais que eu. Reconheço sua tentativa, inclusive por ser ela comum, quase a de todo mundo. Vejo o mérito em você: jamais saberia virar a mesa do jogo. Fracassado um dia, terá sempre vencido alguma vez. O truque funciona; você não é o único com fome de predador.

Sunday, November 19, 2006

Tenho coragem. Num primeiro momento, tive medo, receio de incorporar o próprio sonho. A pior das soberbas é a de quem reconhece o valor que tem. Não pagam nada por mim: credenciam-me com admiração. Sei o susto que sou, quando afronto, quando vou longe, para não voltar. Aconteceu, não planejei. Cheguei a pensar que interromperia. Você, você mesmo, não me condene pela valentia. Disse já: não pensei; quando percebi, estava sendo, acontecido quase. O chão está ficando mais fácil. Se dou risada, não é por desrespeito. Só desprezo a covardia em mim, porque a única batalha derrotada será a minha vida. Fiz pela primeira vez, feito para sempre. Se quero deixar uma impressão, e deixo, é para não renunciar, mais tarde, ao que fiz como legado meu. Na mesa do hot dog, uma pequena abelha, gastando o ferrão num farelo morto de pão. Da natureza invejamos a união. Morrendo, aposta o próprio corpo em nome dum futuro em ser, necessário aos outros da espécie a que pertenço. "Morro por vocês", se falasse um dia - dizendo, do jeito que pode, mais que muita gente. "Existo no que temos de comum. Arrisco-me pela afinidade que deixo em vocês. Alguma parte minha repete-se em alguém." Eu que pensei só para sair do lugar, em pensamento. Vendo uma listra marrom para cada amarela, talvez eu seja assim. Jamais imaginei: li num blog, A incrível fantasia do fantoche de gelo. Toda mentira disfarça a fantasia de quem se encolhe de medo, cedendo. Repito, disse em algumas linhas lá para baixo, existem trilhas que perdoam o tédio do mundo permitido; espécie de último reduto do sagrado, dizem "tudo bem, haverá maneira, mesmo sendo assim". Tudo fala, por menos que possa dizer. Estou no caminho, não espero saber de que lugar. Abandonei a precaução, não sem algumas recaídas. Descobri minha coragem, sem capa vermelha nem escudo de latão. Pode testar.

Thursday, November 16, 2006


O mundo será do meu jeito, o risco da alegria, a pena do tempo; estarei feliz, acho. Mediu minha boca com a língua: "prefiro manchada de batom vermelho". Não sei o que espero... Sendo do meu jeito. Num minuto, o porre foi de fantasia, preciso tanto. Ah, pudesse, alto o tempo inteiro, não existe de outra forma. Pobre de mim, inventaram-me e existo o tempo todo, enquanto sou, no presente. Quando eu existir, será existindo, agora, pode? Se for de novo, e igual, melhor fingir, não é ainda; se voltar a ser, num outro tempo, com o perfume do que não muda, perde o efeito, não vou viver sem graça. Prometi e estava desacompanhado. A voz que fala no escuro nunca cala cedo e atormenta com o advérbio que simula a força de um sempre. Ela pediu, fiz sem culpa, com imenso tesão. Se tenho que ser, sendo entre os outros, vou pintar as relações com guache amarela. Desculpe, não é o intuito, mas haverá borrão.

Monday, November 13, 2006

"Y si he cambiado demasiado para reconocerlos y no llego a precisar que son los mismos, no os dejéis engañar por ello, serán los mismos aunque hayan cambiado. Pues conocer a una persona, conocer un lugar, iba a decir conocer una hora pero no quisiera ofender a nadie, y luego no darle ningún papel más en la vida de uno, es como si, no sé cómo decirlo. No querer decir, no saber lo que se quiere decir, no poder decir lo que se cree querer decir, y decirlo siempre, o casi, esto es lo que importa no perder de vista, en el calor de la redacción."


"Y en invierno me envolvía, bajo el abrigo, con tiras de papel de periódico, y no me las quitaba hasta que despertaba la tierra, hasta que despertaba realmente, en abril. El Suplemento Literario del Times era excelente a tal efecto, de una solidez e impermeabilidad a toda prueba. Ni los pedos lo rompían. Qué voy a hacerle, suelto ventosidades a cada paso, de modo que alguna alusión he de hacer de vez en cuando al asunto, pese a la lógica repugnancia que me inspira. Un día conté mis gases. Trescientos quince en dicinueve horas, lo que da una media de más de dieciséis pedos por hora. Total, nada. Ni un pedo cada cuatro minutos. Es increíble. Vaya, vaya, soy un pedorerro de pacotilla, he hecho mal en decir otra cosa. Resulta extraordinario como las matemáticas ayudan a conocerse a sí mismo."

Friday, November 10, 2006


Tanta era a risada, indescritível a felicidade, que, num tom agudo de voz, incomum, bonita sem outra vez, gastou força só para dizer:

- Entendi, descobri tudo. Desistiram... Isso: desisitiram, tiveram medo, medo das próprias coisas, do diabo que são, que somos. Cada um.

Agitada, com o olho longe de mim, no plano do improvável, respirou aflita, engasgada no excesso de ar, aspirado com necessidade duplicada. Continuou:

- São assim porque não quiseram ser o que são. É essa, essa, é esse o motor para tamanha tristeza. Renunciaram, imagine você, renunciaram todos, em conjunto, em nome de nada, de alguma coisa que não deu certo em ninguém. Absurdo, sei bem. Ser o que o outro foi em nome de alguém. Sem fim, nem fundo. Um labirinto de falta de coragem, de precaução covarde. Entende? O Camus, o Camus, lembra? Em nome do nada, ou do tudo que valeu para os outros, valendo ainda. Ah, meu Deus, vê? Sei tanto, sem saber por quê. Meu Deus... Oh, meu Deus, que é dos outros também. Desgraça... Desgraçada. Tem tempo ainda? Venceram meu sonho? Posso ser? Vão cobrar de mim? Suporto uma culpa que seja minha?

Só me ensinaram a ser absolvido por alguém.

Wednesday, November 08, 2006


Em algum lugar do mundo, no meu país talvez, ouvi um adágio, oração sem rima, embora ritmada; não lembro o que dizia. Só sei que, quando penso que dizia alguma coisa, sem saber o quê, fico longe, na melancolia que é minha, grande no peito, pequena para o mundo. Quando fui pequenininho, apostei que a minha vida seria diferente. Assustado, na rua, ou na saída da escola, estudava o rosto que seria um dia, porque acho que vou ser assim. Se eu for - sendo, serei feliz. Cresci sem deixar de me sentir minúsculo, por causa das relações, provavelmente. Tudo de mais sincero mentiu, por isso doeu tanto e o tamanho diminuiu. Meu projeto era colecionar mundo, remontá-lo, com fantasia, no erro de cada gesto falho. Dos anos e anos que fiquei no mesmo lugar, têm sobrado muitas lembranças, muitos bichos, paisagens, e poucas pessoas, que se matam pelo mesmo espaço e pela moeda de duas caras que não valem nada.

Friday, November 03, 2006

Pour contrôler mon impudicité
J'ai couvert mon coeur d'une pâte filo
Qui me protège de toi et de ta libido
Pour contrôler ma mouillabilité
J'ai appliqué la nitro sur la pâte filo
Et je m'incline devant toi et ta libido
Pour contrôler ma sensibilité
J'ai couvert mon coeur d'une pâte filo
Qui me protège de toi et de ta libido
Pour contrôler ma sexualité
J'ai appliqué la nitro sur la pâte filo
Et je m'incline devant toi et ta libido
(Malajube)
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