Saturday, May 26, 2007

Às vezes, não sei. Têm vezes... Sente? Um encontro com o vazio. Não sei, chega, assim, desavisado. Pode ser no meio do sono, na noite fria; ou com o gosto de manga na boca. Essa ausência, a certeza de que a gente se quebra no meio do caminho. As coisas não ficam, ninguém fica. Vejo uma lembrança próxima, tão distante. Acompanho os passos de alguém que desceu a rua logo à frente. Na minha frente, digo. Depois, como se estivesse acordado, inquieto, no meio da madrugada. Sabe, não sei dizer bem o quê, como e quando. É. Coisa, não? É, sem contorno. É no vazio. Cheio de pistas. Tormenta é reduzir as possibilidades; trocar o mundo grande pelo dia-a-dia de trabalho. Negociar o risco pela certeza. Esquecer a vontade de ultrapassar. Então, num dia, em diversos, "bastar-se". Bastar se eu for capaz. Meus sonhos, a conta que têm comigo, no crediário. Pisar no chão, desprotegido, corajoso, ser o que é. Sem pacto, sem sócios. Espero. Agora, vejam, tantos, tantos anos, depois de tanto lucro e prejuízo. O som que não desmancha. Vou entrar e conversar, outra admiração. O efeito do tempo, o medo de todos nós, da gente. Na mesa, irreconhecível. O desespero que sobrou. A reconquista, depois do sangue derramado. Tem? Ah, eu sei: os anos, os traumas invencíveis, a conversa sagrada. Mas tem vida, aprendi que é uma só.

Monday, May 21, 2007

Sem adivinhação. Seu ponto de vista, distante daqui. São quatro cantos numa mesa para quatro. Mede? Vinte minutos seguidos, uma versão de mundo sentada em cada cadeira. Não, não, esqueçam, isso de que falam, isso que cantam, projeto, felicidade perfumada, amor, sou bem resolvido. Não existe. Que maior descoberta? Não existe. O céu, o jardim da rua sem saída, o gosto de bacalhau, o Deus que cuida de mim - ficção. Tome a sua, leve para a cama, as minhas únicas verdades dormem debaixo do travesseiro. Admiro seu mundo, tão dentro de você. E a gente? Eu falo pouco, pode falar por mim. Falo muito também. Não acho que seja demais. O respeito? Claro, procuro levar a vida com um toque de paixão. Não, nada disso. Que eu não sei nada? Eu descobri meu caminho. Convicto da minha busca. Da sua? O tanto que se perdeu na tradução. A língua mente - das buhr; cultura não tem sexo. Passei o dia com "Frates", em todas as variações. Vou voltar, acho. Preciso. Não sei estar aqui.

Friday, May 18, 2007

- Qual é o preço que eu pago por não deixar de ser eu?
- Rafa, querido, deixa disso, meu filho. Essas perguntas são para mais tarde.

Mais tarde, pensou o garoto - e se eu não for mais eu? Aí não vale, reprovou. Aí não me interessa, decidiu.

Wednesday, May 16, 2007

Até as expressões mais bobas, bobinhas, quando compartilhadas. Foram. Até mesmo elas, as broncas, as risadas que significaram. Quem diria? Quem? Mas esse mundo lembrado, sempre um pouco inventado, tem jeito próprio de correr. As idéias que voltam, que vão. Tudo com essa maneira indomável de ordenação. Atualizam, agora, o passo que foi. O cheiro retorna com nome de saudade, e o gosto que foi toca a ponta da língua com o tempero da imaginação. Toca. Com pensar na expressão, na reação, sentiu o lábio esticar, mansinho, invadindo o terreno da bochecha. Sentiu o dia que fez. E a risada da mãe. Sentiu como se fosse de novo, com toda a distância e a saudade que são. Um pequeno frio na barriga. Friozinho. Por boba que fosse, era lembrança, oras. Entre tantas outras, quis voltar. E voltou, com força, cheia das cores borradas do tempo que ficou. Tudo por um... Um... Não sei se vale dizer, mas. Coisa boba, e ela rira. Coisa boba. Valeu uma risada, curta primeiro, crescendo depois. Tudo por um "samba do miolo doido", que besteira!

Tuesday, May 15, 2007

Monday, May 14, 2007


- Não, não, Leandro, agüenta isso, caramba. Aaaah. Imagina, agora, toda molhada. Não, não, pra lá, que é isso, se a gente sabe ser diferente. Toda essa roupa, essa água, põe isso para outro lado.

Distante, Víctor olhava, criança não fala desse jeito. Escondido na quina do quintal, protegido do jato da mangueira: muito mundo corria pela cabeça enquanto acabava a brincadeira. Saudade. Quando sinto melhor as coisas que não acontecem comigo. Sinto. Estou encharcado.

- É água, Raquel. Água. Ninguém morre molhado.

A gente seca, pensou Víctor, do outro lado. O nosso corpo seca, o tempo todo, e até o fim.

- Ai, ai, chega, agora não quero mais. Acabou. Sem graça.

Graça. A água molhar o chão de miracema, o canteiro, as tartarugas. O mundo girando, um sorriso com a impressão de ser no mesmo lugar. No dia seguinte, meu ponto da terra ficou longe do chão do dia anterior. É essa a saudade, rapaz. Agora entendo que tanto fica perdido "ontem". Nem Saturno, nem o novo planeta da televisão. E se o o universo gira também? Então saudade de tudo, para sempre perdido. Leandro estava feliz.

- Diz, diz: a-mi-za-de. Diz. Diz e, enquanto está dizendo, repara. É coisa boa que você pensa, não é?

Raquel disse.
Víctor. Havia um jeito errado. Não é texto que criança diz. Fechou os olhos, devagarinho. E sozinho, em silêncio, repetiu: "a-mi-za-de". Uma segunda vez: "...mi-za-de". Gozado, o tempo passava mais devagar. E é bom? Fez de novo: sagu de vinho.

- E você gostou?
- Do quê? Do sagu?
- Não, Víctor. Do beijo, moleque.

Leandro bateu no ombro do melhor amigo: Raquel já não beijava como das primeiras vezes.

Saturday, May 05, 2007


- Prefiro a meia luz.

O tempo passa por cima da gente. Algumas situações, rápidas e imprevisíveis, abandonam o sentido antes mesmo de cobrar algum. No dia anterior, na feira, que duro passar as horas contando camarões. Agora, deitado, existe alguma coisa que não venço. Um aperto no peito, uma fuga de intenção, uma causa pouco conhecida, um espinho que, picando, explica; é o que é.

- Você já repetiu isso das outras vezes.
- E, pelo jeito, você não entendeu.

Fernanda correu e apagou a luz. Cobriu um pouco o corpo. Estava envergonhada.

- De repente, você mudou. Aliás, você muda, assim, de repente. Sempre.
- Escuta: algumas coisas tomam tempo da gente. Entender é um verbo desses. O relacionamento, uma abstração dessas.
- Você tem me agredido, acho. Não sei. No começo, nas primeiras vezes, era diferente.
- Que bom: se a segunda tivesse sido igual, não haveria a terceira... Nem esta, então.
- Você me confunde. Confundiu inteira. Ando estranha. Mal sei dizer o que quero. Admiro você, acho que amo, mas estou machucada.
- Decepção, talvez.
- É que... Bem, o jeito como você fala, a sua experiência. As palavras bagunçam o efeito de qualquer toque. E você fala bem demais. Seduz com tanta cultura. Mas, não sei, esconde alguma coisa.
- Fernanda, o diálogo não constrói uma vida conjugal. Poucas palavras diminuem as chances de desilusão. Falemos menos, pequena.
- Menos.
- Meu melhor cachorro foi também o maior de todos eles. Quando saía na rua, me sentia protegido.
- Por que isso? Você insiste num pensamento não-linear. Não precisa: basta dizer que não quer mais, que está cansado da mesma conversa.
- E não foi o que eu fiz? Sou incapaz de lembrar minha vida na ordem em que ela aconteceu.
- Você me acha uma criança.
- Você é minha aluna.
- Não, pare com isso. Quando interessa, eu sirvo de mulher.
- O que mais chama sua atenção quando uma voz desafina?
- Não sei. Algum motivo para a pergunta?
- Você desafinou agora há pouco.
- O que você enxerga em mim?
- Uma menina, doze anos mais nova que eu.
- Víctor... Quanto importam esses doze anos?
- Um dia: tempo demais para uma vida nova; de menos para os resíduos de toda uma vida velha. Um personagem meu disse isso.
- Você disse, você quer dizer.
- 12 x 360 dias. Muita vida para nos tornar incompatíveis.
- Você vai morrer sozinho.
- Não nasci com outra intenção.
- Qual é o problema entre a gente?
- Enquanto estou aqui, com você; enquanto toco o seu lábio e sinto você descobrindo o mundo, me lembro de uma igreja escura na qual rezei em Plymouth.
- E o que isso tem a ver comigo?
- O mundo, menina: de tamanhos diferentes.
- Acho que entendi. Fique tranqüilo, não serei fronteira na vida de ninguém.
- Não é você, Nanda. Também não é nada tão sério.

Thursday, May 03, 2007

Tuesday, May 01, 2007

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