Desculpe se eu estiver sendo invasivo; na verdade, acho que estou. Quer dizer, não sei se tem maneira de falar, com intenção de amizade, sem participar. Eu sei. Invadir e participar são coisas diferentes, e essa diferença pressupõe uma autorização, uma bandeira hasteada, alguma sinalização. Mas o que eu quero é que você entenda que a gente tem pouco tempo para evitar dizer as coisas por inteiro, inclusive se elas forem invasivas e se ser invasivo for errado.
Mas acho, e acho mesmo, que, nisso tudo, o seu susto maior, o medo que você está sentindo, tem a ver com o fato de talvez estar se dando conta de que o mundo que te foi dado não é exatamente o mundo no qual você está se descobrindo. Tentanto filtrar de uma maneira mais certeira: você conheceu três, quatro pessoas que deram a entender que são parecidas com as pessoas que você gostaria de ter, mas que não são como as pessoas que você tem. E o "ter" aqui é totalmente figurado, você entende.
É isso que eu percebo quando conversamos. A Lara, por exemplo, encantou você por aquilo tudo que você não tem, que não achava que precisaria ter, mas que, agora, no tumulto, está parecendo parte do mundo que você imaginou nas mil vezes em que colocava Eno para escutar.
Quando eu tinha uns 17 anos, li Demian, do Hesse, e gravei aquela passagem do "Quem quiser nascer tem que quebrar o ovo" - mais ou menos assim. E, falando nela, me lembro de outra, do Beckett, em Esperando Godot: "esqueço na hora, ou me lembro para sempre".
Você ainda não quebrou o ovo, e está pensa nisso o tempo todo.