- Então, você se fez uma promessa?
- É, é o que eu lembro.
- E cumpriu?
- Não... Não sei, quero dizer. É por isso que vim até aqui, entende? É que cheguei a comentar, a explicar um pouco, isso que eu queria, sentia, imaginava que faria... Disse isso tudo a você um dia.
- Eu?
- É.
- Sei, sei. Acho que lembro, sim. Você andava confuso, cheio de dúvida, até rezava à noite. E chorava durante o dia. Era só eu recomendar uma música, e você dizia "depois", jeito de evitar a "sensibilidade compartilhada".
- É, acho que você tem razão. Apesar de achar também que, com o tempo, a gente aceita ser menos cara, sendo mais coração. Perdendo o receio de falar da vida, do desespero que aperta, com amigos. Poucos amigos, no meu caso.
- Claro, natural. Aconteceu comigo também. Até a infecção urinária que peguei de uma lituana virou assunto de bar.
- Ou de MSN. Comecei a falar disso tudo, mas com timidez. Para dizer, contar de verdade, comecei a usar aquele serzinho amarelo do messenger. Até para dizer "parabéns"... Quantas vezes convoquei aquela bolinha-piscadela? Que sei? 1000? Milhão?
- Mas você passou a dizer?
- Muita coisa.
- A promessa também?
- Não, não. Essa foi "ao vivo", num bar da Tabapuã.
- Honrou?
- É você quem diz.
- Bom, li no seu blog: você tá pintando, não? Tem um livro com coisas suas na Alemanha...
- Na Argentina também.
- E então?
- Não sei. Cumpri?
- Em parte.
- Dá para ser feliz pela metade?
- Existe vida inteira?
- ?
- Existe?
- Sei lá, por quê?
- Porque, mesmo se houvesse, dividiria a minha em pedaços. Acordei e dormi em partes diferentes. E, às vezes, sinto como se tivesse vivido mais de uma vez. Sem deixar de ser eu em todas elas.
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