Eliana está no oitavo degrau da escada de saída da Estação Marechal Deodoro. Tem os olhos molhados. O dia não foi bom. Descendo do vagão, rapaz na porta - "saindo", perguntou. "Não, entrando, dã", agressivo; Eliana não é uma porta. Eliana, os amigos todos ficando velhos. A Heleninha separou, até. Lembra quando almoçaram juntas em seu primeiro dia de trabalho. Sem grana, pediu um pão de queijo e uma água com gás. "Não, não, imagina, não estou com fome mesmo". A vida é um fracasso, pensando Eliana, outro degrau. O primeiro namorado, que era para ser o último, porque seria para sempre. Foi o único. O cheiro da pizza, agora, logo na saída da estação, convencida, meu Deus, nunca mais a mesma pizza da mesa cheia na casa da tia Cecília. Preocupada com a quinta parcela do sofá novo da sala. O verso da daquela música do Gil errado na cabeça. Leite de soja é horrível. Triste, Eliana, ninguém olha, ninguém paga um centavo por mim. O dia orçando remédios e produtos farmacêuticos. Sem mérito nenhum na vitória da licitação do mês passado. Se foi só por minha causa, barbaridade, se fui eu que dei para o João Paulo, óbvio. Eliana abre a bolsa, remexe. Não usa fósforos faz tempo. Acende o cigarro. Atravessa na faixa. No resto de lona que enrola o mendigo, "sobrevivência". Detesta chegar penteada. Bagunça a franja, desarma a divisória. Dor de cabeça, vou ficar gripada. Separa a água, caneca nova, duas aspirinas, glub, glub, glub. Não faz mal.
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