- Sabe, garoto, você é uma das poucas pessoas que compra livro aqui.
- Talvez porque esteja deixando de ser garoto, acho.
- Não, não. Vem gente mais velha, tudo pra ver show.
- É, as estantes estão meio paradas mesmo. Mas isso é uma livraria, certo?
- Da esquina.
- Aãh, é isso então. Promíscua.
- Estuda Letras?
- Não, não. Sou dependente de uma boa ficção.
- Meu único cliente que consegue escolher um bom livro, bêbado.
- Justamente por causa da fantasia.
- Para saltar num livro...
- Não, pelo contrário. É pular para fora deles, com eles.
"Era garoto ainda oito anos se tanto; eu-ela minha mãe num asilo de velhos para visitar minha avó; levei comigo pequeno urso de pano novinho em folha; colega de quarto zuruó dela minha avó não tirava do colo boneca surrada escamurrengada que só vendo; coração confrangiu; horas depois quando já entrava na charrete pra ir embora súbito arrepiei caminho entrei no quarto dei ursinho de presente pra amiga dela minha vó; agora aqui ixi fantasma semi-evanescente no corredor deste Fórum aguardando sentença hã logo-logo trancafiado dez quinze anos talvez numa cela mondongueira qualquer; assassinato; ser humano é mesmo misterioso imperscrutável."
(p. 22 - E. A. F.)
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