Monday, January 01, 2007

O futuro não virá em 2007


- E por que Patagônia?
- Não sei. Pela beleza árida, pela proximidade. Porque não quero ficar parado; minha lei de vida é achar que nunca terá bastado. Que sobra mais, que jamais chegarei a alcançar. Minha vontade precisa ser pequena perto da oferta de mundo. A vida tem que ser vivida com a convicção de que não será suficiente.
- Suficiente?
- Um universo infinito esperando por mim. As pessoas, que são sagradas, que encantam pela palavra, ou pelo gesto desconhecido. O "pode ser", um verbo na condicional... Dependo das minhas incertezas.
- Mas você não pode ver isso tudo de onde você está?
- Comentei uma vez: sempre estaria melhor em algum outro lugar.
- Na Patagônia?
- Por ora, sim. Mas logo haverá alguém me esperando numa estação em Tartu. Numa tarde de sol, aflita, modificada pelo tempo que não deixa de passar.
- Você pensa em ficar em algum lugar?
- Prefiro pensar que os lugares, e as pessoas, ficarão em mim.
- Você não respondeu: dá para ser novo, sendo diferente, sem sair do lugar?
- Já vi gente tentar. Eu mesmo. Não sei... A gente desiste, por medo de chamar a atenção. E fracassar.
- Não entendo.
- Entende, sim. Pode parecer distante, mas preferimos estar com os outros, como os outros, porque, de alguma forma, são aposta de uma espécie que quer durar. Em grupo, no abrigo do número, fica menor o medo de continuar. Poucos indivíduos suportam a responsabilidade sobre um futuro incerto e diferente.
- Mesmo?
- A mutação, tão bonita pelo anúncio da espécie nova, quando falha, paga preço alto, que é a própria sobrevivência.
- Não queremos o risco de provar a diferença?
- Não. Definitivamente. Igual aos outros, sofreremos, quando muito, como todos os outros. Juntos, à custa de muita dor, sorrimos, absolvidos pela insegurança que é de toda a espécie.
- Você acredita num homem do futuro?
- Acredito na Patagônia, no xale de cor diferente que existe ali. Acredito num tom de azul que toca a terra, avermelhada. Num dança circular, num pop seduzindo um pedaço de terra distante. Num piado que soa à novidade. Acredito que o homem do futuro, se houver, haverá para arriscar, para gritar e chorar em nome da própria independência. Esse homem, que você convoca do futuro, será mais homem na medida em que não matar outros homens pela necessidade de se autoperpetuar. O homem por vir agirá pela espécie, cada vez mais consciente. O amor prevalecerá sobre a paixão, e a história revogará o protagonismo da natureza.
- Você já conheceu um homem do futuro?
- Nenhum esforço meu me tirará da condição da vida no presente... Mas li a respeito, em ocasiões muito especiais. Por enquanto, homens assim só existem em nossa fantasia.
- Curioso: nascer mutação, nesse sentido, tem imensa poesia.
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