Meio sem jeito, Fernanda enxugou um pouco o olho, isso é tão bonito que, não sei, dá vontade de chorar. É que... Tão estranho, imagina, por ser bonito desse jeito, de verdade desse jeito, acho que era para ser feliz. Mas. Mas tem alguma coisa que foge imediatamente quando nos damos conta de que é tão bonito, e vem uma saudade, uma certeza de que está ficando para trás, de que inevitavelmente vai mudar, mais feio, não tão bonito, de novo. Senti isso algumas vezes contadas, foram poucas, muitas, por serem tão bonitas. Estava no carro com minhas irmãs, em Miami, acredita? A gente estava voltando de um restaurante, à noite, tocou no rádio "Girls just wanna have fun" e foi tão enormemente delicado e honesto - as três ficaram com vontade de chorar, e cantamos. Depois, será que você vai lembrar, lá no Ibirapuera, a gente estava sentado num banco de concreto, olhando o lago, você falou de um aniversário que foi piquenique numa noite de 2003, que estava sem dinheiro, sem planos, quando ligaram, estamos passando aí. Você sempre fala desses seus amigos, daqueles seus amigos, com vontade de ver tudo de volta, porque tem pouca ideia do que andam fazendo, do que anda acontecendo com cada um. Seu olho ficou vermelho, fiquei meio quieta, alguns amigos também, mais previsíveis talvez. De repente, o mundo surpreende com coisas parecidas, mas diferentes, que emocionam igual. A gente não sabe prever, mas até sente quando vai ser assim. Corre um ar gelado por dentro, lembro o tanto que sempre me protegi no colchão, quando chegava em casa, quando chegava a noite e eu não sabia muito bem o que aconteceria no dia seguinte. Na maioria das vezes, foi o café da manhã, com cereais e alguma fruta, até eu substituir o leite integral por desnatado. Só que, à noite, era essa brisa que eu sentia, que me encolhia. O mesmo vento frio de quando alguma coisa muito bonita vai acontecer.
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