Depois de muito tempo, encontrei o Marcelo, velho amigo, dos tempos de faculdade. Estava com uma moça simpática, a Bia, cabelo no ombro, escuro. Convidaram para uma cerveja, meio de improviso. Só uma, hein? Preciso terminar um trabalho de tradução para amanhã. Receio de interromper alguma coisa. Sentei, contei sobre o que andava fazendo, o ano que passei na Dinamarca, meus empregos informais, o fim do namoro com a Flávia, o fio narrativo do romance que vinha tentando escrever, a bagunça do arpartamento, pequenininho, meio amontoado, aluguel em conta. Falei do último jogo que tinha visto no estádio, tempo já; da Manuela, mãe solteira; da feira de móveis de segunda mão organizada perto de Vinhedo, da nova linha de metrô, da exposição do MAM e do casaco que estava vestindo, velho, uns 5 anos, acho. A Bia falou do bolinho de arroz, retruquei com a melhor receita da minha mãe. Em seguida, falei de uma viagem que estava planejando para Caracas, loucura mesmo, atravesso a fronteira a pé. Demos risada de algum comentário na mesa ao lado, como nos tempos do bandejão, não sei como a Bia ria sete anos atrás. Quando estava para me levantar - na verdade, apertado para ir ao banheiro -, o Marcelo deu um tapinha na mesa, espécie de ponto e vírgula na fala, emendando que
a vida é a vida, Luís.
E por absurdo que pareça, sabendo pouco da vida, parcialmente distraído pela pressão na bexiga, entendi perfeitamente o que o Fumaça quis dizer.
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