Não arrisco dizer se triste ou engraçado. Vejam só. Descobri, recentemente, numa conversa de esquina, aqui na República do Líbano, cresci fragmentado, vida fracionada. Começou, regra, com uma lembrança. Que vira outra lembrança, até, lembrança, ser zil trilhões de lembranças, que se repetem e nunca acabam. No dia da mesada, que era semanada, preferi, todas as vezes em que pude, escolher o bolinho de 1 a nota de 10. Ou no primeiro dia de aula, nervoso, colégio novo, o par de meia embaralhado. Calado, falei com pouca gente, muito pouca, na raia dois, sempre dois, da escolinha de natação. Esquisita a identificação que tive com os números primos. 17 por 11 anos seguidos na lista da classe. Dividido com um, ou com ninguém. Sempre misturei lego e playmobil - não doía nada. E no álbum de Animais do Mundo, esfreguei a tatuagem do pacote de salgadinho. Ficou bonito, garanto. Não tive um grupo de amigos, tendo amigos em grupos nos quais também não tinham tantos amigos assim. E, na casa toda, meu quarto precisou ser de outra cor. Com a claridade, vejos uns bichinhos flutuando no olho - são bem menores contra o fundo azul. Verdadeiro céu numa casa cheia de fantasmas e paredes brancas. Dobrava a folha perto da formiga grande. Desdobrava entre as formigas pequenas. Botão de seis ou sete times diferentes - sem ser o Botafogo, exclusivo do meu irmão. 4 camisas de times argentinos rivais. Mais bonito. Nas aulas de alemão, o mesmo lapso do inglês. E duas palavras seguidas em castelhano. Joder. A quietude é um laboratório arriscado: planeja cruzamentos sádicos; quando vê saída, improvável. "Silêncio é pátio de desmanche clandestino", escrevi no banheiro do motel em que trabalhei.
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