O rapazinho chegou mais perto do confessionário. Se vai, se volta. Muito frio na barriga, medo do pecado imperdoável, o mal irreversível. Toda a semana, todo um desespero: "como vou fazer? se faço?". Texto experimentado, voz marcada. Mesmo o lado da franja, preocupadamente repartida. Não queria ter de, falar em, justificar por, que tudo dava calafrio. Ser quase o Diabo, fraco e seduzido, refém da falta de patrulha de um momento: o fraquejo e uma ocorrência.
- E, então, meu rapaz? O senhor saberá perdoar um filho arrependido.
- É que... O senhor sabe. Dos males, o grande, o menor. Seu padre, o senhor entende.
- Diga, criança. É Justo.
- Padre, quando a gente se deixa invadir, digo, quando vem e é bom, quando até faz bem, porque deixa mais feliz, quando nos faz melhores no mundo, para o mundo - ainda assim, é?
- É o quê, meu filho? Pecado?
- É, padre. Acho que o senhor me entende...
- Meu filho, qual é o seu pecado?
- É que não sei se é, apesar de imaginar que seja, tanta condenação.
- Meu garoto, só Ele condena. Eu escuto e receito a cura. Se ainda houver alguma.
- Seu padre, é que, o senhor me perdoe, mas, em casa, uma vez, tocou uma sensação forte em mim, uma vontade de mais, um arrepio, nem pensei, tão bom que foi. Suei, perdi o teto, o chão. E foi, aconteceu, sem controle, com pouco juízo.
- Meu filho, seja mais claro. Por que dobrar a punição com detalhes de uma fantasia suja?
- Não, senhor, não é isso, é que preciso saber se foi, se tem pecado, maldade e danação, quando existe amor... amor entre irmãos.
- Garoto, preste atenção, o que você insinua, ameaça dizer, é sério demais. Vermelho e infernal. Se entendo bem. Entre filhos da mesma mãe, meu Deus?
- Isso, padre. O amor, a paixão, essa vontade proibida não tem perdão?
- Muitos "Pai Nosso" e muitas "Ave Maria", perdição. Que horror. Ojeriza, é o capeta. Compaixão. Com irmã? Ah, piedade. É do Diabo.
- Mas não é isso, seu padre...
- Garoto, não tem o direito, a avaliação só chega do Céu. Diga o que fez e terá o castigo que lhe cabe. E, talvez, com muita disciplina, alguma salvação.
- Seu padre, por favor, seu padre. Mas eu vi na foto, eu vi. O senhor tem que entender. Na enciclopédia, quando fazia o trabalho sobre o muro de Berlim. Eu li a frase, acreditei.
- Anda, menino, o pecado, rapaz. O senhor entenderá. Eu sei.
- "O amor", padre, "o amor cura todos os medos". Foi o que eu li na legenda da foto do muro de Berlim.
- Mas que raio foi isso que você fez com sua irmã, alma condenada? Horror, meu Deus. Perdoai, senhor.
- ...
- Anda, diga logo, diabos. Se ainda houver absolvição.
- Não tenho irmãs, senhor.
- E então?
- Então o quê, senhor?
- Deixe de chorar, impertinente. Confesse agora o crime que fez.
- Seu padre, perdão, seu padre, mas "o amor perdoa o medo", e foi com o meu irmão.
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