Tuesday, December 05, 2006

Na parede da sala de Xavi.


- David, David, eres un vendaval, chaval. Bueno, ya lo esperaba, siempre atento, muchas veces crítico. Ves? Si me lo preguntaran, seguro que se lo diría. A qué viene eso ahora? Ya, ya, no te enfades, sigo igual, creo. Un poco diferente, quizás. Hombre, dónde estará el que no habrá cambiado? Al menos una renuncia, sólo una... Bueno, algunas. Vamos, y tú? Qué va! Ya veo, sigues igualito; no, no, estás más guapo, joder! Verdad, no? Son las chavalas, he? Qué polla la tuya, macho!

Tinham crescido juntos; que outra impressão? O movimento das mãos, os sintagmas bem arranjados, a opinião explicada com inteligência, a pressa de virar o mundo, a saudade que doía, a vontade de refazer pela terceira vez, a dúvida saudável, a convicção de uma vida livre do privilégio dos outros, as poucas relações sinceras, o desprezo pela covardia dos ex-melhores amigos, as trocas e os conselhos negligenciados, as brigas bobas, o orgulho de quem vale muito. Xavi podia ver tudo de novo, com saudade de quando, juntos, descobriram o valor que existe na palavra amizade. Tinha pena agora, e uma ponta de vergonha: abraçara a cobrança do mundo em nome de causa nenhuma. Ouviu de novo o ruído dos anos que atravessou diante da televisão. Leu cada linha das páginas que só soube escrever nos intervalos do trabalho, longe do domínio da mulher, na casa entediada. Escutou o silêncio da esposa quando de algum violento comentário inteligente. "Estava com ela no último encontro; David olhava com olhar de piedade". Soube de tudo isso, enfraquecido, distante do que melhor viveu na vida. Não via tempo para mais nada; a gente se suicida quando censura a alegria aos 24 anos. Olhou de novo, David estava ausente, tendo estado tão presente um dia. Inteiro num universo mágico, permitido só para ele. Os cílios compridos, o cabelo desgrenhado, uma vida tomada como desafio, em nada obrigação. Xavi sentiu os pulsos amarrados, refém de uma culpa que disseram ser "opção sua". Não foi, juro que não. Receei: quando vi, tinha sido. Pelo menos você, David. Diga que entende! Era para ser aventura, caramba. E foi desilusão. Apaixonado por Penélope, estudante fascinante do seu romance novo, apresentada na página 66, David andava desinteressado da roda dos demais. Um sim, ou não, pouca coisa mudava-lhe o estado de atenção. Quis verdade, entrega, lealdade. Buscou refúgio nos livros, pediu perdão pelos próprios pecados, talvez houvesse um paraíso negociado. Desistiu, o céu tinha de ser inventado. As ruas tinham cores, ainda havia motivos então. Escreveu uma primeira vez para não largar mais. Matou um bode num primeiro parágrafo; viu que o bicho não levantou jamais. Comeu uma gorda loira num terceiro capítulo; gozou sem outra igual. Correu num jardim laranja até cruzar o sol. Vestiu asas e desmontou a luz lilás. Teve sede. Teve frio. Lavou o corpo com sorvete. Cuspiu quatro pepitas de ouro. E congelou. Foi mais velho; até rebatizou. Nasceu pela vigésima vez.

- David, hombre, qué pasa? Dónde estás, macho? Y si me apunto a tu mundo?
- He, Xavi, he, no seas pesado.
- Te acuerdas del tema aquel que solíamos cantar de pequeño?
- De quién?
- Los Planetas, me parece.
- Claro, chaval. Te refieres al de "Corrientes circulares en el tiempo", verdad?
- Te acuerdas del estribillo?
- Por supuesto, macho.

Os dois mediram o tempo na ponta da língua, contaram o compasso e, melancolicamente:

- "Las secuelas de los viejos días
estarán conmigo el resto de mi vida..."
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