Decidi: se é para ser assim, para ser uma vida que não sonhei, elogiada pelos outros; se é para ter um trabalho que precisa ser, uma mulher que vale o preço das contas, um cotidiano sem mim; se é para sorrir com um nó na garganta, cantar a música que querem ouvir, disfarçar a solidão, cobrir tamanha frustração com as baboseiras alheias, ser padrinho por ter dinheiro para o presente, ter certeza de que é pouco, de que era para ser mais; se é para desistir do que eu fui, sempre pensando em ser; se é para disputar com os amigos, se houve amigos; se é para pensar pelo resto, aceitar os acordos, assinar os contratos, ter filho para dar sentido, para ter o que olhar, cuidar; se é para renunciar em cadeia, chorar escondido, imaginar o que poderia ter sido, despistar a cobrança do tempo, o medo do fracasso, a ausência de confiança, a quebra da lealdade, o abandono dos aliados; se é para ser desse modo, que seja sendo rico, dono do ouro, do bônus e das comissões, do cheque alto, do cartão de crédito, com pagamento a vista e a prazo, em notas de 100, em bilhetes de 1000, em tristeza de milhão.
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