Thursday, October 12, 2006

Entendi que não é para mim. A casa projetada durante anos, o tijolo escolhido a dedo, a tolerância de todos os dias. Não é para ser porque não sou assim. O quintal pode ter a camélia mais bonita; será sempre de alguém. A noite sem aventura. O sono mal dormido. O sexo rotineiro. O copo sobre o criado-mudo cai, estala e repete o que eu sabia. O quadro torto na parede, a estante cheia de pó, o sofá manchado com o mijo do cachorro, o violão aposentado, o computador ligado, a porta do lavabo fechada, o tempero inventado, os cinco anos que eu não vivi. Uma menina de nome H duvidou que eu conseguiria. Eu também. O perfume que não é meu enjôa o espaço - é quando subo a escada do prédio e sinto o cheiro da comida do vizinho. A tradição precisa condenar. Então pesa a culpa de ser sozinho, entre irmãos. Quando me falou daquilo, o olho ficou carregado: a alma arrastava sombra maior que a sua lá dentro. Tem medo de alguma coisa. Fala triste e, no pequeno minuto do dia em que respira sem a algema de alguém, chora, escondido. Quer acreditar que o amanhã seguinte será diferente. "Pode ser, ou o problema está comigo". Talvez passe a acreditar num dono da vida que foi sua: um Deus, um filósofo alemão, um guitarrista de uma banda pop, meu escritor favorito. Enquanto houver guru, a responsabilidade sobre a infelicidade não será só minha.
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