Um grande amigo deixa o copo sobre a mesa, ajeita o cabelo, raspando as unhas:
- E como é que a gente faz para não se afogar em saudade? Nada, na vida, consegue ser tão perigoso. O medo das coisas perdidas, se perdendo. Está vendo? Só isso. Acima de tudo, isso: quem aceita ficar sem o caminho de casa? Não guardei foto nenhuma de quando eu era criança. Meus discos velhos estão velhos. E eu ando com saudade. Não sei se você entende quando digo isso. Que o mundo vai fazendo falta pelas coisas que faltam no mundo. Que a gente demora dois, três tempos, na hora de dizer tchau.
Bruno, não falei nada ontem. A cerveja. O presunto parma. A vontade de ficar em silêncio contou muito também. Algumas palavras não me fazem bem. Quando entendi que seria a última vez que mexeria no vasinho de azaleias com meu vô, porque simplesmente entendi - e tinha 13 anos -, travou a garganta de dor, que era saudade. Porque aquele vaso não era aquele vaso. A azaleia, só a azaleia. Saudade, no singular; saudades, no plural: tudo do mesmo tamanho. Muito mais que o dobro do meu.
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