Caramba. Eu, separando o troco do táxi, deixando as moedas do troco do táxi num copo de vidro que tenho na escrivaninha, e essa água que corre do olho, aprendemos a chamar de lágrima, inexplicável. Vendo tudo embaçado, tentando acertar as teclas, as coisas passam passam para dar certeza de algumas coisas, reforçar a dúvida em outras. Lembro tanta gente. Lembro tanta noite deitada pensando em gente. Nem todo mundo entende que o último dia de um ritual de alguém tem a gente, anos atrás, tomando um táxi, um avião, tem a gente anos depois, ouvindo Juan Stewart, dizendo ou pensando "a vida é, a vida é, e ela só é". "Ela é muito é". "E foi". "Ela é". "E está sendo, tchau." E alguém, de coração-entrega, diz que está doendo o estômago, e você entende, e você tem saudade, às vezes dói o estômago também. Com pinga, normalmente dói mais, querendo doer menos. Quando você tiver sessenta anos, muito mais forte e claro que 60 anos, você vai vestir uma camiseta do Rolling Stones e ter saudade de alguma coisa que veio antes e aconteceu antes de você ter saudade das coisas que vieram antes. Vou mandar mensagem, vou dizer que lembro do começo, que lembro de Buenos Aires, que lembro de um amigo argentino, que lembro da gente. Depois, vou encher um copo novo de pinga e dizer que está tudo bem, que é assim e que tenho certeza das escolhas tomadas sem certeza. Vou dizer que tenho saudade de Buenos Aires. Tenho saudade de Barcelona e de Berlim. Tenho saudade das cidades que começam com "b". E dos amigos que partem do "f", do "c" e do "g", para terminar no "o", dizendo "obrigado". E, chorando, acho, vou dizer "obrigado", mesmo sem ninguém, ou Deus, ouvir. "Obrigado".
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